segunda-feira, 4 de março de 2013

Separação por Inês Pedrosa

Eu li muitos dos livros dessa portuguesa incrível que é a Inês Pedrosa. Ela tem uma habilidade de construir personagens femininas que nos colocam em uma eterna situação de conforto/desconforto. Só para não esquecer:

"Provavelmente só se separam os que levam a infecção do outro até aos limites da autenticidade, os que têm a coragem de se olhar nos olhos e descobrir que o seu amor de ontem merece mais do que o conforto dos hábitos e o conformismo da complementaridade. Só se separam os que não suportam saber-se iguais a si próprios, a sépia, no correr dos anos, depois do muito que, na lucidez extrema do amor, cresceram juntos. A separação pode ser o ato de absoluta e radical união, a ligação para a eternidade de dois seres que um dia se amaram demasiado para poderem amar-se de outra maneira, pequena e mansa, quase vegetal. Um abraço parado sobre o tempo, que se estreita no momento em que, aos olhos do mundo, desaparece, porque excede os modelos predeterminados da guerra e paz. Um último desejo de imortalidade, que acende a noite onde todos os desejos pareciam adormecidos no sono dos justos e dos realizados. Amantes de alguns anos, redescobrimo-nos deslumbrados, em voo sobre a melancolia do passado comum e o abismo do futuro solitário. Só nós dois sabemos que não se trata de sucesso ou fracasso. Só nós dois sabemos que o que se sente não se trata - e é em nome desse intratável que um dia nos fez estremecer que agora nos separamos. Para lá da dilaceração dos dias, dos livros, discos e filmes que nos coloriram a vida, encontramo-nos agora juntos na violência do sofrimento, na ausência um do outro como já não nos lembrávamos de ter estado em presença. É uma forma de amor inviável, que, por isso mesmo, não tem fim."

Trecho de Nas tuas mãos de Inês Pedrosa

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